Bairro simpático. Conjunto de casas iguais. Todas coloridas. Um córrego. Fundo de vale. Logo ali na baixada vive Helena, uma menininha de apenas dez anos. A mais velha da sua turma. Vive Helena e tantas outras crianças. No mesmo lugar e na mesma situação.

Sua mãe levanta cedinho e corre pro trabalho. Trabalha limpando casa
de família há oito anos. Todo dia tudo é sempre igual. Semana após semana. Sabe de cabo a rabo como deixar a casa da patroa em ordem.

Helena estuda no período da tarde. Apesar de ter que aprender a se
virar sozinha. Nenhuma mãe sairia sem peso na consciência ao deixar uma
criança sozinha em casa. E, apesar da correria, conseguia se virar.

Enquanto isso, a menina levanta meia hora mais tarde do que sua mãe. Se
arruma e vai ao encontro de outras crianças da comunidade. Ainda que
pequenos, andam como gente grande. Percorrem um caminho de mais ou
menos meia hora. No calor. No frio. De baixo de sol ou chuva. No caminho de ida e volta.

Pra eles, quem ainda tem muito que aprender, apenas uma distração.
Andam lentamente, sem pressa nenhuma na vida. E se divertem como nada
os pudesse atrapalhar. Boicotando os problemas cotidianos.

Chegam ao destino, depois de uma caminhada agradável ao lado dos
amigos e com diversas brincadeiras. Sorrindo. Param logo ali, na casa vermelha. No serviço de assistência social. Como um espaço grande ao redor onde se estacionam os carros. Cercados por grade de arame. Entram e, mesmo o espaço sendo pequeno para tantas crianças, se aconchegam.

Não conseguem correr muito ou fazer algum esporte, como toda criança gosta. Mas se divertem ao participar de oficinas que conseguem criar algum objeto artesanalmente. Enfeites, porta retrato ou lembrancinhas para os familiares.

É tudo o que possuem e o que podem oferecer no momento. Passam todas as manhãs iguais, antes da obrigação de ir pro escola. Sem nunca reclamar da rotina.

A turminha sai do local. Ainda sorriem. Dão passos no mesmo ritmo.
Sorriem com a mesma intensidade e a diversão jamais fica de lado.

Apesar do mesmo modo de vida cada um carrega consigo um sonho diferente.
Fulano quer ser jogador de futebol. Beltrano um advogado ou médico.
Sicrano um corredor. E a Helena é uma sonhadora, que carregar o mundo nas mãos.

A menina não vê a hora de essa realidade cruel acabar. Sabe que a mãe rala
pra pagar as contas. O pai sumiu. Os passeios diários no serviço da assistência social pela manhã é uma ajuda de custo pra colocar o alimento na mesa. Sabe que não sobra nada. Que algumas roupas do armário foram ganhas e outras são do natal passado que deu pra comprar com o décimo terceiro de sua mãe.

Ela às vezes pensa que é injusta ao falar em realidade cruel, já que com tanto esforço tem o mínimo pra subsistência. Mas ainda sabe o quanto é cruel andar milhas sem o dinheiro da passagem só pra ter um estudo e tentar vencer na vida. E pra chegar até lá precisa viver e pensar como gente grande !

Crédito da foto: Arquivo do google