Lá está ela. E tudo que ela reflete sobre nós. Durante quatro anos, ou mais, não teve um dia que não a observei. Em cada chegada e saída. Mesmo em movimento, passava pelos meus olhos em câmera lenta. Induzindo a minha lembrança para lá.

Tudo o que foi importante refletia pelo quadrado de lados desiguais do outro lado da rua. Para mim, translúcido. O cenário com a luz amarela me fazia enxergar além.

A visão da sua janela me transportava para outra dimensão, o tempo parava por alguns instantes e me levava de onde saí. De onde, talvez, nunca quisesse ter saído. Não por você. Mas, por algum motivo maior, tive que partir. Isso era o que eu podia fazer de melhor. Pra você e para mim.

Como em uma caixinha, em que se guarda o que deseja, aquele espaço continha tudo sobre mim e sobre você. Os nossos desapegos e desprendimentos. Nossas aventuras. Loucuras. Segredos. Encantos e descontentamentos. Tudo encaixotado em um só lugar. Onde foi despejado barris de sensações.

Precisei sair às pressas. Assim que esvaziei o cubículo, tranquei-o com o mais forte aço. Sabemos que o que existiu não se quebra, mesmo com inúmeras tentativas. Zelar é o melhor que posso fazer por nós. Independente da lacuna que sempre existiu.

Toda vez que passo as lembranças retornam de forma vaga, mas com a certeza de que existiram inúmeras coisas boas. Hoje, aqui do outro lado da rua a única coisa que consigo ver é a janela da sua antiga casa e a lembrança boa que ela me traz de você.

(foto: outonoemsilencio.com)